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Ser apolítico é um privilégio, e uma ilusão

  • Foto do escritor: Isabel Debatin
    Isabel Debatin
  • 23 de jul.
  • 3 min de leitura
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Por muito tempo, eu achei que política era sobre partidos, debates que não levam a nada e gente gritando na televisão. Preferia me isentar. Dizia que não queria saber, que não me envolvia, que não era pra mim.

Mas a vida foi me mostrando que política não é só o que aparece no horário eleitoral, e que se você pode ignorar a política, provavelmente é porque o sistema ainda te favorece de alguma forma.


Na escola, sem nem perceber, eu já estava envolvida: votei numa chapa de gremio estudantil e, depois, ajudei a formar uma nova. A gente criava propostas, pedia votos e discutia ideias. Era uma eleição clássica. Ali eu já estava participando de uma das formas mais puras de política: a escolha de representantes.


Na faculdade, isso se intensificou. Fui vice-presidente do Centro Acadêmico e viajei até Brasília para defender uma causa da minha universidade. Vi de perto como decisões tomadas por políticos impactam diretamente a vida de milhares de pessoas. Ali, entendi que quando a gente vive em sociedade, precisa de representantes. Não dá pra cada um lutar por si só.


Quando me formei, trabalhei como jornalista e assessora de imprensa. Vivi a política nos bastidores: assessorei um deputado estadual, cobri eleições e acompanhei debates intensos em redações e campanhas. Vi muita coisa bonita sendo feita, mas de outro lado vi mentiras, vaidade e propostas absurdas. Aprendi que política é, antes de tudo, sobre gente. Sobre o que pode ser feito para melhorar a vida das pessoas que confiaram em alguém para representá-las.


Hoje, o que me preocupa não é só o desinteresse, é a idolatria. Viramos um país de torcidas organizadas. Um contra o outro. Muita gente nem entende do que está falando, mas defende com unhas e dentes um político como se fosse um parente querido. E, nesse embate cego, as ideias, os projetos e o país ficam em segundo plano.


Mas a política de verdade está em tudo. Está no preço do arroz. Na creche do seu filho. Na gasolina que você põe no carro. Está na forma como o seu país se comunica com o mundo, nas decisões internacionais que afetam diretamente o nosso bolso (e a nossa tão sonhada paz), no tempo que você espera por uma cirurgia pelo SUS. E ignorar isso não faz com que essas decisões deixem de existir. Só faz com que outros decidam por você.


Ser apolítico é um privilégio. E também é uma ilusão. Porque, mais cedo ou mais tarde, a política bate à sua porta. E, quando isso acontecer, que você esteja de olhos abertos, com senso crítico e coragem suficiente pra não se calar, nem se esconder.


Política é sobre quem vive e quem sobrevive.


Quando alguém diz que “não gosta de política”, o que muitas vezes está dizendo é: “a política não interfere diretamente na minha vida a ponto de me fazer levantar da cadeira.” Mas esse é um privilégio que nem todo mundo tem. Ser apolítico é possível quando você não depende de políticas públicas para viver com dignidade.


Ser apolítico não é neutralidade. É cegueira seletiva. E, por mais duro que pareça, é também um egoísmo disfarçado de indiferença. A gente pode, e deve, discordar sobre ideias, sobre planos de governo, sobre visões de mundo. Mas não dá mais pra fingir que política é um tema opcional.


Porque enquanto uns dizem “não me envolvo com isso”, outros estão lutando todos os dias por coisas básicas que deveriam ser garantidas. Fingir que dá pra viver à parte da política é viver dentro de uma bolha que, mais cedo ou mais tarde, vai estourar. E quando isso acontecer, que a gente não diga que foi pego de surpresa, mas que, finalmente, decidiu olhar com responsabilidade para o mundo em que vive.

 
 
 

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