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Low profile: o novo luxo é não se mostrar

  • Foto do escritor: Isabel Debatin
    Isabel Debatin
  • 9 de jul.
  • 3 min de leitura
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Existe algo de muito sedutor em desaparecer. Não no sentido trágico, mas sim na decisão consciente de estar menos disponível, menos exposta, menos conectada. Na internet de 2025, onde tudo é postável, o “não postar” virou uma forma de expressão, [talvez até de poder].


O estilo de vida low profile [de quem posta pouco, não revela muito, vive quase como se a internet fosse um detalhe], deixou de ser apenas comportamento isolado. Virou tendência. Cobrança. Dilema.


Eu não sou uma pessoa low profile. Pelo menos, não naturalmente. Trabalho com conteúdo, divido minha rotina, sou feita de palavras, registros e observações. Mas mesmo pra mim, esse movimento tem chamado atenção. Tenho observado o quanto as pessoas estão buscando essa “retração digital”, talvez como forma de sobrevivência emocional. Tenho sentido o peso de estar sempre disponível. E isso vai além da exposição pública: é sobre a falta de silêncio interior.


Hoje, a gente não apenas vive com o celular na mão.

A gente dorme com ele, come com ele, cozinha com ele, toma banho com ele.

É WhatsApp, e-mail, Instagram, Threads, TikTok, grupos da escola, da empresa, do condomínio, da família.

É expectativa de resposta imediata.

Uma loja que não responde às 23h pode perder a venda. Um amigo que não responde em 10 minutos pode parecer distante. Criamos uma cultura em que o “agora” é obrigatório, e o não responder já é uma resposta.


Essa urgência, esse modo alerta permanente, tem nome: media fatigue. Uma fadiga digital real, estudada, que causa irritação, ansiedade e até sintomas físicos. Estamos exaustos — de estímulo, de exposição, de comparação.

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Hoje mesmo pensei sobre isso.

Saí para tomar um café com uma amiga, e em algum momento me veio a pergunta:“Se eu não postar que estive com ela, será que aconteceu?” E me dei conta: aos olhos de quem me segue, talvez não. Talvez aquele café, aquela conversa, aquele carinho silencioso entre amigas tenha simplesmente não existido. Porque eu não registrei. Porque eu não marquei. Porque eu não transformei aquilo em conteúdo.


Essa sensação é familiar. Eventos parecem não ter acontecido se não aparecem em stories. E essa lógica, que antes era inconsciente, agora começa a ser questionada. Aos poucos, viver virou mais importante que provar.


Antes, o luxo era mostrar tudo.

Hoje, o luxo é não mostrar nada.

A privacidade virou um novo status.


E aqui entra o paradoxo: o low profile se tornou tão desejado que virou performance também. Influenciadores que ensinam como sumir das redes. Vídeos mostrando como fazer detox digital. Conteúdo sobre “desaparecer com consciência”. O que era liberdade virou estética.


E às vezes me pergunto: será que isso é realmente sobre saúde mental? Ou será só mais uma tendência vendida como estilo de vida? Tem gente que quer viver da internet, mas sente que está se desmanchando nela. E aí surge o dilema: me exponho ao máximo pra crescer, ou sumo pra não adoecer?

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Já desativei minhas contas algumas vezes. Em momentos de cansaço, de sobrecarga, de me sentir exposta demais. Às vezes até como tentativa inconsciente de ser procurada — uma forma delicada de chamar atenção. Mas o que percebi foi o contrário: tanto faz. Você estar ou não estar... tanto faz pra maioria das pessoas. Elas estão ali, mas não estão. Estão presentes, mas não estão olhando. É um consumo automático, esvaziado, viciado. Principalmente no Instagram, onde o comportamento mudou radicalmente nos últimos anos. Ninguém mais assiste com atenção. Todo mundo desliza com pressa.


E mesmo assim, sumir ainda parece uma espécie de privilégio. Porque estar offline exige coragem, e também estabilidade. Muitos criadores de conteúdo, como eu, vivem um dilema: o algoritmo quer frequência, constância, presença. Mas o corpo e a mente pedem pausa. E aí entra a loucura: como mostrar que ser low profile é legal... sem deixar de mostrar?


O impacto na rotina é nítido. Quanto mais distante das redes eu fico, menos eu me comparo. Menos me saboto. Menos me cobro. Ganhar espaço mental é um presente que a ausência traz. A criatividade respira melhor. A maternidade flui mais leve. Até o tempo passa diferente, mais devagar, como deveria ser.

E, pra mim, o limite ideal não é numérico. Não é um post por semana, nem só Close Friends. É o que faz sentido naquele dia. É quando o conteúdo nasce de vontade, e não de obrigação. Mas claro: pra quem vive da internet, esse senso de liberdade é mais difícil. A gente caduca mais fácil. A gente é testado o tempo todo.


No fim das contas, o charme de quem some talvez não esteja em sumir, mas em escolher.

Escolher quando estar, com quem estar, o que mostrar. E, principalmente, escolher o que preservar.

Se o mundo inteiro está em modo exposição, talvez o maior luxo seja ter algo só seu.

E saber que a vida segue, mesmo que ninguém tenha visto.

 
 
 

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